Edu Conceição – O seu silêncio e ar sisudo relevou um pouco da sua vida

Edu Conceição – O seu silêncio e ar sisudo relevou um pouco da sua vida

7 de Fevereiro, 2020 10 Por Vitor Martins

O Eduardo Conceição foi um dos casos sinalizados da vila de Neves, uma das mais distantes da cidade.

Quando a Fátima me enviou a fotografia, o seu ar sisudo fez-me parar um pouco para pensar. A primeira coisa que me veio ao pensamento foi vê-lo de óculos na cara. Tinha a certeza que ele iria começar a ver o mundo de outra forma, mas será que só isso chegava?

Só encontrei a resposta passados três longos meses. Quando chegámos ao  Projecto Integrado de Desenvolvimento Social do Distrito de Lembá em Neves, o Eduardo foi o primeiro a receber os seus óculos.

A Irmã Lúcia fez questão de ir chamá-lo à sala de aula e de o trazer para ao pé de nós. Mal o vi ao longe, o seu rosto continuava igual ao da fotografia que tinha recebido três meses antes.

Chegou-se a nós, nem um sorriso, perguntei-lhe o nome, ele respondeu, perguntei-lhe se tinha pais ou irmãos, ao que ele prontamente me respondeu que não. Achei um pouco estranho mas continuei com a minha missão.

Mal lhe meti os óculos na cara percebi que estava a ver muito melhor. Ficou ali assim meio espantado durante um minuto e ninguém disse nada. No fim perguntei-lhe como se estava a sentir, e ele, baixinho disse-me, estou a ver tudo diferente.

Entretanto, tínhamos combinado com a Irmã Lúcia, deixar a “Lenda da Chanfana” na escola, para que todos pudessem saber um pouco deste prato tão importante para a nossa região. A Irmã prontificou-se a ficar com a responsabilidade de passar a mensagem aos alunos e agradeceu-nos pelo gesto.

De seguida iríamos entregar outros óculos, mas ainda não tinham encontrado a criança. Era o momento para ficar um pouco mais com o Eduardo e tentar falar com ele. Disse-lhe para tirarmos uma fotografia juntos, mas nem assim lhe consegui arrancar um sorriso.

Expliquei-lhe a forma de usar os óculos, como limpar as lentes, e ele, sempre atento, não disse uma palavra. No fim, só me disse: Obrigado, muito obrigado!

Fiquei contente, mas ao mesmo tempo triste, pois não sabia o que inquietava esta criança. Chamei o Vitor para ele tirar uma fotografia com o Eduardo, com o pensamento de o desinibir mais um pouco, mas foi impossível.

Entregámos os restantes óculos, deixámos de ver o Eduardo, ficámos mais um pouco à conversa com a Irmã no pátio da escola, e aí percebemos o porquê, do ar triste do Eduardo.

Realmente ele não tinha pais, a mãe faleceu de doença e o pai deixou-o sozinho e fugiu para Angola. Quando soube da história apeteceu-me largar tudo e ir abraçá-lo.

Com oito anos de idade, ter passado pelo que já passou em termos familiares, foi mais uma lição de vida!

Vimos centenas de crianças com muito pouco e julgávamos que era triste, mas não existe maior tristeza que a perca ou abandono de alguém e aqui estava uma prova disso. As crianças com pouco brincavam felizes, o Eduardo não.

Saí dali de coração partido, mas sabendo que o Eduardo irá ter melhor qualidade de vida com os seus óculos novos e que a Irmã Lúcia fará os possíveis e os impossíveis para o integrar na comunidade.

Boa sorte Eduardo! <3