Penacova e Vila Nova de Poiares – Onde a Natureza e a Gastronomia andam de mãos dadas

Penacova e Vila Nova de Poiares – Onde a Natureza e a Gastronomia andam de mãos dadas

3 de Julho, 2020 27 Por Vitor Martins

Começámos as nossas férias vindos de Coimbra. O nosso objetivo seria conhecer um pouco mais de dois Concelhos que nos são bastante familiares, pois foi lá que crescemos, e é lá que temos as nossas raízes.

Vindos do IP3 em direção a Viseu, cortámos no nó de Miro e subimos até à Serra da Atalhada. Aqui existe um complexo de moinhos de vento, todos eles restaurados em pedra. Foi aqui que passei parte da minha juventude no Verão, a ajudar a reconstruir um dos nossos maiores patrimónios.

Neste momento, e por várias circunstâncias, a maior parte dos moinhos foi comprada por particulares que aproveitam como espaço de lazer aos fins-de-semana. Alguns ainda fazem a moagem da farinha, através do vento e das suas mós e outros servem de alojamento.

Era num desses que iríamos ficar uma noite. O moinho do Ourives, como todos os outros, tem excelentes condições para podermos descansar em família, num lugar completamente diferente. Na serra da Atalhada podemos apreciar a bela Serra da Estrela, a Serra do Caramulo, a Serra da Lousã e a zona de Penacova. Aqui a paz impera!

Deixámos as nossas coisas no moinho e fomos até ao Vimieiro, no Rio Alva. É um lugar de muito fácil acesso, tal como os moinhos de vento. Aqui podemos relaxar, dar um mergulho, beber um copo ou fazer uma refeição no espaço que reabriu há semanas. Por aqui existe também uma roda, que serve para tirar água do rio. De seguida entra numa valeta e segue para regar os cultivos. Por detrás da roda existem várias casas de Turismo Rural, onde também podemos ficar muito bem instalados.

O dia já ia longo, subimos novamente a Serra da Atalhada e fomos apreciar o magnífico pôr do sol.

No dia seguinte, o nosso objetivo era entrar na mítica Nacional 2 em direção a Vila Nova de Poiares e foi isso que fizemos. Num ápice entrámos na N2 e na Livraria do Mondego, conhecida mundialmente pelas suas rochas em forma de livros. Aqui existe um passadiço que podemos fazer a pé, mesmo ao lado da Nacional2.

Daqui, seguimos e logo mais à frente, deparámos-nos com a Praia Fluvial do Reconquinho, onde existe um parque de campismo e um café-restaurante. A praia é grande e um ótimo lugar para ficar em família em segurança. Mas o nosso objetivo era ir conhecer a nova atração de Penacova. O “avião” está mesmo por cima da praia, na serra da Carvoeira. O caminho é difícil, mas vale mesmo muito a pena. Lá de cima o Rio Mondego e Penacova, ficam ainda mais bonitos.

Desta vez não fomos à Vila na outra margem, mas por lá existem também muitos lugares dignos de serem visitados, como o Miradouro do Penedo de Castro ou o Miradouro de Penacova.

Como a nossa intenção era ir pela Nacional 2 seguimos, e logo à frente, ficámos a perceber que estávamos no ponto mais ocidental da Estrada, na aldeia do Louredo, que tanto diz à Ana, pois foi lá que os seus avós viveram. As crianças estavam maravilhadas com a paisagem e o património, até agora estavam a portar-se lindamente.

Como prémio de recompensa, fomos brincar um pouco, no Louredo Natura parque mesmo ao lado do ponto mais ocidental da Estrada Nacional 2, nas margens do rio Mondego.

Por lá ficámos até tarde, tínhamos de ir conhecer o nosso próximo alojamento. A Casa nas Serras fica no quilómetro 246 e foi lá que passámos o resto do dia a descansar.

No dia seguinte, combinámos com o senhor Adélio e fomos até aos Casais conhecer um pouco da arte da cestaria, que é tão famosa por lá. Apesar de estar em vias de extinção, por falta de pessoas mais jovens que aprendam a arte, o senhor Adélio ou o Paulo Sena, um pouco mais novo, ainda se sentem capazes de ensinar a arte a quem queira aprender.

Os cestos são feitos com folha de acácia, uma árvore bastante forte, que gosta muito de água e que se “reproduz” como poucas. Para chegar à folha, existe um longo processo. O tronco tem de ser desfiado até chegar ao ponto certo. A partir daí vem a técnica de emparelhar até chegar ao produto final, tão usado na minha infância pelos meus avós para levar a comida para o campo.

Depois de uma longa conversa, percebemos que o senhor Adélio conhece a minha família e até tinha acabado de vir de uma aldeia ao lado da que vivem os meus pais.

Voltámos novamente à Nacional 2 e fomos até ao centro de Vila Nova de Poiares. Por esta altura, são milhares as pessoas que passam por aqui. No quilómetro 248, Central Bar, houve desde há dois anos a esta parte, um forte investimento na promoção do local, mas acima de tudo de Vila Nova de Poiares.

Aqui podemos encontrar vários produtos tradicionais, feitos em Vila Nova de Poiares. Pelo centro já existem lojas com recordações e produtos regionais para que os turistas possam levar algo que é nosso.

Perbecemos que, Vila Nova de Poiares pode ter muito a ganhar com a Nacional 2. Que haja a verdadeira consciência comercial e política e todos podem ganhar. Voltámos novamente à Casa nas Serras, mas antes ainda passámos pela Igreja de Santa Maria que está mesmo ao lado. Durante muitos anos, tudo que se angariava de dinheiro, revertia para ajudar os estudantes. A Universidade como compensação, doou um brasão seu à Igreja, tornando-se a única igreja com um Brasão da Universidade de Coimbra.

O dia seguinte acordou chuvoso, mas a nossa missão de hoje era conhecer a essência da maravilhosa Chanfana. Esta maravilha gastronómica tem grande parte da sua história no Restaurante Confrade, que funciona na altura da Semana da Chanfana que decorre todos os anos em Janeiro, por volta do dia 13, que é quando é assinalado o dia do Município, ou então com reservas de grupos.

Por vários motivos, o ano passado tivemos o privilégio de sermos convidados para pertencermos à Confraria da Chanfana, convite que aceitámos de imediato. No nosso olhar do mundo, podemos promover no que nos é possível a nossa região, e a Chanfana é um dos grandes motivos para que as pessoas nos visitem.

A entronização teve lugar em Setembro passado pela altura da Poiartes, um dos maiores certames da região. Por motivos profissionais, aquando da entronização os meus filhos não estiveram presentes, por isso fomos mostrar-lhes o mundo da Chanfana.

No restaurante ficaram a perceber que existem muitos amantes de chanfana, muitos deles bem conhecidos de todos nós. De seguida fomos à sede, onde existe um pouco da história da Confraria da Chanfana, uma das mais antigas confrarias de Portugal. Fica aqui desde já o agradecimento à Confraria da Chanfana e à ADIP-Associação de Desenvolvimento Integrado de Poiares pela disponibilidade. Um abraço especial ao nosso Juiz, Jaime Marta Soares e a Doutora Madalena Carrito, vice presidente.

O dia já ia longo mas tínhamos de ir conhecer o Centro Difusor de Artesanato e Recursos Endógenos em São Miguel de Poiares. Por aqui as crianças tiveram o primeiro contato com a louça de barro preto. Seria o início de uma grande aventura de descobrimento do mundo da Chanfana.

Era hora de descanso, mas antes tínhamos combinado com um amigo de longa data, ir beber algo fresco ao Ribeiras Bar e meter a conversa em dia. Terminámos o dia em grande no Alojamento Local Dom Dinis.

O dia seguinte reservava muitas surpresas às crianças. Saímos do Dom Dinis e entrámos novamente na Nacional 2 em direção a Olho Marinho. Era lá que estava o Fernando da LBP Barro Preto à nossa espera para nos contar um pouco da sua história. Foi na sua fábrica que ficámos a perceber o quão difícil é produzir uma peça de barro preto. Ela tem de estar mais tempo no forno para que ganhe esta cor tão característica. O processo de produção é trabalhoso, e de arte.

Como adoramos conversar, cedo percebemos que tínhamos no Fernando um parceiro. Depois da breve explicação e mostra de como se produzem as lindas peças de barro preto, ficámos à conversa sobre o futuro. Esta é mais uma arte que está a ficar sem sucessores. A sua família pertencia a uns dos mais de trinta oleiros de Olho Marinho, e ele é dos poucos resistentes. Com a morte do seu pai, que tanto insistia na aprendizagem da arte, decidiu investir em máquinas mais modernas.

Antes do Covid-19 tudo corria naturalmente. Agora tudo mudou e o Fernando está muito apreensivo quanto ao futuro desta tradição. Nesta incerteza, ficámos tão maravilhados pela recepção que decidimos abrir uma garrafa de cerveja Boazona que tínhamos comprado ao primeiro produtor de cerveja artesanal de Poiares.

Despedimo-nos do Fernando e fomos tirar uma fotografia no quilómetro 260, que tem uma particularidade. A cada dez quilómetros os marcos da estrada ficam quadrados para assinalar o feito. Um pouco mais a baixo na Aldeia da Venda Nova a casa dos Nove Arcos esperava por nós para mais uma noite de descanso.

Acordamos bem cedo, hoje iria ser um dia em cheio!
Tínhamos combinado ir visitar uma azenha de água,novamente no concelho de Penacova, moer o milho e levar a farinha para fazer a broa e assim foi.

Logo cedo o Tó lá estava para nos mostrar a sua azenha. Ela estava completamente destruída e ele recuperou-a da forma mais original possível e agora é uma grande atração na aldeia do Carregal.

Depois de moer o milho, as crianças levaram a farinha para a Casa Mouramortina, onde o Filipe e a sua familia nos esperavam para cozermos a broa e a chanfana em forno de lenha, que iria ser o nosso almoço.

Enquanto a mãe do Filipe tratava do almoço, o Filipe iria dar-nos a conhecer a Casa Mouramortina, local onde iríamos ficar esta noite. Aqui cada canto tem uma história. Este alojamento local é diferente dos outros onde estivemos. Aqui respiramos história. História de Coimbra, da Universidade, dos estudantes, mas também história da Moura Morta, de Vila Nova de Poiares e dos Concelhos que os rodeiam.

Das dezenas de peças com história nesta casa, destacamos uma mala de viagem, talvez das primeiras malas de viagem, que está num dos quartos.

Outro pormenor extremamente interessante na casa é o quarto “mágico”. Aqui todas as crianças tem de fechar os olhos e pedir que se faça magia com muita força em frente a uma estante com livros. Quando os abrem abre-se também uma porta que os leva ao quarto mágico.

Uma casa pensada com gosto e acima de tudo que conta a nossa história. Era chegada a hora de ir meter a broa no forno. De seguida fomos meter os ingridientes na Chanfana.

A carne de cabra velha, sem um caçoilo de barro preto, sem um bom vinho, colorau, louro, cabeças de alho, salsa, banha de porco, sal e piripiri, não fica deliciosa. A broa estava pronta a comer. Quentinha com manteiga, que delícia!

Passados três horas, a Chanfana estava pronta a ser comida. Uma verdadeira iguaria. De tão deliciosa que estava, ficámos bastante cheios.

A casa Mouramortina tinha uma surpresa e a solução para os nossos problemas mais uma vez. Fomos fazer um passeio de canoa pelas margens do Rio Alva mesmo ao lado da casa para queimar calorias. A Epicland tratou de tudo, foi uma tarde em cheio, adorámos.

No fim do dia ainda fomos visitar a Ponte da Mucela, que liga os concelhos de Vila Nova de Poiares e Arganil, uma ponte com mais de 2000 anos. De seguida, as crianças foram gravar o seu nome numa árvore. Na casa Mouramortina existe uma mini quinta biológica, em que as crianças podem ter contato direto com o cultivo de vários produtos e se se portarem bem, ficam com a sua própria árvore.

Para finalizar o dia fomos beber uma jeropiga tão típica desta região, enquanto as crianças foram aprender a encher e fumar os chouriços.

As férias estavam a terminar, e neste último dia por Vila Nova de Poiares, saímos da Casa Mouramortina e apanhámos  a Estrada Nacional 17 em direção a Vila Nova de Poiares.

Esta estrada, que liga Coimbra a Vilar Formoso, foi durante muitos anos a principal via de acesso além fronteiras na Zona Centro de Portugal. Foi ela que fez desenvolver a restauração  em Vila Nova de Poiares. Subimos a serra de São Pedro Dias e descemos às Medas, onde existe o Restaurante As Medas, com mais de 50 anos de história. Logo a seguir, está a cortada para Alveite Grande e para a Chã da Cabeça com é conhecida por lá na Serra da Fraga. Aqui apreciámos as magníficas vistas para Vila Nova de Poiares e é aqui que opera a Poiares Aventura, nas suas descidas de parapente.

É também aqui, que existem muitos trilhos do Poiares Trail, um dos maiores eventos desportivos de Vila Nova de Poiares. Este ano foi realizado em Fevereiro e teve mais de 1500 participantes de todo o país e do mundo.

Descemos a serra de Alveite em direção a Vila Nova de Poiares e logo encontrámos o Restaurante Estrela da Mó, um restaurante de referência nacional. Aqui,a comida tradicional com a cozinha moderna aliam-se de uma forma extraordinária.
De seguida entrámos na Zona Industrial de São Miguel de Poiares, e parámos no Restaurante Paddock, muito famoso pelo seu bacalhau assado. Aqui temos uma vista fantástica para a pista do Karting de Poiares e ficámos a apreciar um piloto de Poiares a treinar.
Voltámos novamente à Nacional 17, passámos pelo Restaurante Dona Elvira um dos mais antigos da região. Seguimos em direção a Vila Nova de Poiares. Fomos visitar o Jardim da Raça Poiarense, que simboliza a força e tradição das gentes de Vila Nova de Poiares.


Ao lado está o Bar do Jardim, onde pudemos descansar um pouco.
O jardim está inserido num Complexo Desportivo onde o Healthy Fitness GYM opera de uma forma bastante dinâmica e original como pudemos constatar. Com toda esta situação as aulas de grupo são dadas na parte de fora do ginásio, e isso demonstra a força de vontade, originalidade e a paixão que o seu dono tem pela sua profissão. Do outro lado da estrada está a Alameda de Poiares, local de grandes eventos como a Poiartes, um dos certames mais conceituados da região Centro ou a Poiares Rotações.
Vila Nova de Poiares tem uma grande tradição no desporto automóvel e a Poiares Rotações é a prova disso.
Existe também o Poiares Off Road para os amantes de Jipes, o Grupo Motard de Vila Nova de Poiares para os amantes de motas e os Javalis da Serra para os amantes de BTT.
Pudemos constatar que VN Poiares é uma terra de grandes desportistas.
Saímos da Alameda e fomos em direção novamente à N17.
As crianças tinham tido mais um dia bastante cansativo mas tinham-se portado lindamente. Como recompensa parámos no Restaurante A Grelha e comprámos-lhes uma caixa de Poiaritos, uma das mais famosas sobremesas daqui.


Ficámos a saber que é la que existe um dos melhores arroz de bucho de Vila Nova de Poiares, que não provámos, mas fica a promessa de voltar.
Um pouco mais a cima parámos no Serras Bar para beber algo fresco na sua extraordinária esplanada.
Aqui terminava a nossa viagem por terras de Penacova e Vila Nova de Poiares.

Foram dias incríveis e inesquecíveis. Ficámos com a sensação que não conhecemos metade das tradições e da gastronomia destas gentes, mas também ficámos com uma certeza, a de que, iremos voltar novamente!
Muito obrigado pela simpatia e acolhimento!
Até um dia!

O nosso Olhar do Mundo 03-07-2020